Recentemente, um tuíte da Deputada Federal por São Paulo, Joice Hasselmann, causou uma certa repercussão em alguns setores da mídia e nos círculos de engenheiros e arquitetos “vitaminando”, por assim dizer, os argumentos daqueles que defendem pautas como a do fim da anuidade dos Conselhos, ou o fim da ART/RRT, ou ainda o fim dos Conselhos de Classe e por aí vai. No Twitter, a citada Deputada postou “Pipocam mensagens com pedidos para o fim da anuidade/mensalidade do CRECI, CREA, OAB, CREMERJ , etc… muitos brasileiros estão impedidos de atuar em suas áreas por não conseguirem pagar as altas taxas.
Chegou a hora de discutirmos a extinção da OBRIGATORIEDADE??#pagaquemquer”. Inicialmente é importante frisar que os profissionais em situação de exclusão do mercado de trabalho na área da engenharia podem requerer a suspensão temporária do registro ficando isentos do pagamento da anuidade; ou ainda aqueles em situação de fragilidade financeira podem optar pelo parcelamento desta. No caso dos recém-formados, estes possuem um desconto de 90% no pagamento da primeira anuidade. Ou seja, a afirmação de que “… muitos brasileiros estão impedidos de atuar em suas áreas por não conseguirem pagar as altas taxas” carece de uma análise mais acurada pois, no caso do CREA, ela não se configura como efetiva.
Em que pese o fato de se tratar de um questionamento onde, acredito, a parlamentar não tenha ainda “fechado questão” sobre o tema, é importante salientar que o CONFEA – Conselho Federal de Engenharia e Agronomia e o CREA – Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Estabelecidos pelo Decreto-Lei n° 23.569, de 11/12/1933) se constituem em Autarquias Federais de Direito Público sendo, a um só tempo, órgãos de governo e de representação da sociedade civil os quais foram criados com o objetivo de regulamentar o exercício de profissões que o Estado considera capazes de causar prejuízos à saúde, à segurança, à liberdade ou ao patrimônio dos cidadãos.
Neste sentido, a Lei 5.194/66 regulamenta o exercício da Profissão de Engenheiro e a Lei 6.496/77 institui a Anotação de Responsabilidade Técnica – ART na prestação de Serviços de Engenharia enunciando em seu Artigo 1º – Todo contrato, escrito ou verbal, para a execução de obras ou prestação de quaisquer serviços profissionais referentes à Engenharia, à Arquitetura e à Agronomia fica sujeito à “Anotação de Responsabilidade Técnica” (ART) e ainda em seu Artigo 2º – A ART define para os efeitos legais os responsáveis técnicos pelo empreendimento de engenharia, arquitetura e agronomia. Com isso, nenhum profissional pode iniciar uma obra ou serviço sem a emissão da ART a qual é um instrumento de defesa da sociedade, que tem por objetivo de identificar o responsável técnico pela obra ou serviço e, também, comparar com a qualidade dos serviços prestados.
O Sistema CONFEA/CREA possui em seu escopo de trabalho inúmeros serviços de grande importância aos seus profissionais, porém, este que vos escreve se aterá, apenas aos aspectos delimitados até aqui ficando para uma próxima oportunidade o esmiuçar das outras atividades prestadas pelo Sistema. A importância do CREA também reside na necessidade premente de fazer cumprir os preceitos vislumbrados pelo legislador quando delineou o aparato jurídico acima elencado, se não vejamos: Além do CREA, qual a instituição que diligencia as obras, condomínios, empresas, hospitais, barragens, órgãos públicos e tantos outros partícipes na área de engenharia os impelindo a nomear os respectivos Responsáveis Técnicos e a observar as medidas para garantir o resultado esperado e amparado nas Normas Técnicas vigentes? Se constitui num verdadeiro “tiro no pé” militar pelo fim da anuidade e, como consequência, a desidratação financeira do CREA pois este fato contribuiria para a ampliação da informalidade na Engenharia do país.
A atual administração do CREA/SP, na pessoa de seu Presidente Vinicius Marchese Marinelli, tem como uma de suas filosofias a melhoria contínua do Conselho; melhorias estas que também podem ser resultado de uma maior participação dos profissionais dando sugestões e enviando seus projetos. Iniciativas como o Congresso Estadual de Profissionais (http://www.creasp.org.br/noticia/institucional/2019/03/20/10-congresso-estadual-de-profissionais-cep/3141) dão aos profissionais a oportunidade de externar e apresentar suas propostas de maneira produtiva no intuito de aprimorar cada vez mais o Sistema.
A eventual ausência do CREA e das citadas e necessárias Responsabilidades Técnicas por parte dos profissionais podem ter como consequência tragédias e danos materiais imprevisíveis. Infelizmente o número de exemplos desta é amplo e tem se tornado cada vez mais recorrente. As razões para isso também perpassam pela falta de informação dos tomadores de decisão os quais negligenciam os potenciais riscos inerentes a falta de acompanhamento técnico devido nas atividades de engenharia.
Neste último dia 18 de março duas pessoas morreram e uma ficou ferida devido a um acidente com um elevador de carga num condomínio de alto padrão em Salvador. Segundo informações da mídia local, estes três operários trabalhavam em uma obra cujo síndico do condomínio em lide não exigiu as respectivas Anotações de Responsabilidade Técnica para o início da mesma. Caso este cenário realmente se evidencie como o real, o síndico será responsabilizado pelo sinistro e pelas mortes. Caso houvesse um Responsável Técnico formalmente estabelecido este fato poderia ter sido evitado ou, minimamente, o responsável pelo condomínio não seria implicado civil e penalmente de maneira singular.
Dada a amplitude do assunto, este artigo não tem a pretensão de abordar todas as suas nuances, mas sim chamar a atenção para aspectos não explorados devidamente sobre o mesmo e, com isso, lançar luz sobre um assunto que pode (e deve) ser exaurido ao máximo com o objetivo de elucidar as dúvidas da sociedade que acabam resultando em tuítes como o formulado pela Deputada neófita na Câmara.
Prof. Eng. Joni Matos Incheglu Março de 2019