A Câmara Municipal de São Paulo aprovou na terça-feira (2) em segundo turno, por 41 votos a 12, a nova revisão da Lei de Zoneamento da capital. A proposta altera regras para construção de obras e os tipos de atividades permitidas em cada bairro. Os vereadores votaram outros cinco projetos que alteram leis urbanísticas, entre eles o que prevê a criação do Parque do Bixiga.
Um projeto de revisão da Lei de Zoneamento já havia sido aprovado em dezembro de 2023, mas voltou para análise dos vereadores porque a versão sancionada pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) tinha inconsistências. Os vereadores contrários afirmam que as alterações propostas fragilizam áreas de proteção ambiental e deixarão a capital mais vulnerável a eventos climáticos extremos.
A votação também abriu caminho para favorecer a expansão imobiliária em áreas da capital paulista. Um dos projetos aprovados trata da carta geotécnica, um instrumento técnico que examina as condições do solo e do subsolo tendo em vista os riscos geotécnicos. Agora, com a aprovação, as Zonas Eixo de Estruturação Urbana (ZEUs) localizadas em áreas de terra mole e solo compressível da planície aluvial e nas cabeceiras de drenagem poderão terem construções se o responsável pelo empreendimento apresentar soluções para o rebaixamento do lençol freático.
“Algo assim jamais poderia ser votado dessa maneira, num pacotão, sem debate com a sociedade. Certamente a votação vai ser contestada judicialmente”, afirmou o arquiteto e urbanista Nabil Bonduki, que foi relator do Plano Diretor na cidade em 2002 e 2014 e dirigiu ainda a secretaria de Cultura na gestão do ex-prefeito Fernando Haddad (2013-16).
O projeto é defendido pela atual gestão sob argumento de que é necessário atualizar a norma. O texto já havia sido aprovado em primeira votação, em junho.
Segundo a vereadora Silvia Ferraro (Psol) a revisão promovida pela prefeitura foi insatisfatória porque prejudica a população mais pobre e por favorecer a especulação imobiliária, além de liberar construções de grande porte em áreas verdes e de proteção ambiental. “Nós vimos o que ocorreu no Rio Grande do Sul, precisamos proteger áreas verdes, não diminuir restrições para que essas áreas possam se transformar em ZEUs, ou seja, áreas de onde se pode construir”, afirmou.
Votaram contra o projeto as bancadas do Psol (5 vereadores), do PSB (2) e parte da bancada do PT. Eliseu Gabriel (PSB) disse que o projeto deve ser questionado na Justiça e criticou a forma como Ricardo Nunes encaminhou a proposta, segundo ele de forma apressada e “passando a boiada”.
Relator do projeto, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) defendeu, em artigo publicado no jornal “Folha de S.Paulo”, que o processo foi debatido de forma democrática e, embora célere, movida pela “boa-fé”. Segundo ele, as revisões feitas foram necessárias para corrigir falhas anteriores que inviabilizavam o planejamento para uso e ocupação do solo.
Operações e planos urbanos
Vereadores também encerraram a análise do projeto de lei da Operação Urbana Consorciada Faria Lima, que prevê investimentos na região de Paraisópolis. Todos os vereadores votaram pela aprovação.
A Câmara também encerrou a análise do projeto de lei que altera a Operação Urbana Água Espraiada, como é chamada o conjunto de regras urbanísticas na região que envolve áreas como parte da Marginal Pinheiros, avenidas Jornalista Roberto Marinho e Chucri Zaidan.
Também tiveram a análise encerrada em dois turnos outros dois projetos de autoria da prefeitura, um deles propõe mudanças no Plano de Intervenção Urbana (PIU) Arco Jurubatuba, na região sul, e o segundo no PIU Setor Central. Esses planos são estudos técnicos realizadas para ordenar e reestruturar regiões da capital com base no Plano Diretor.
Os projetos preveem obras diversas, viárias, habitacionais e de infraestrutura, em bairros daquelas regiões. O PIU Jurubatuba inclui bairros como Interlagos e Vila Andrade, na zona sul. O PIU Central, por sua vez, prevê alterações nos bairros da Liberdade e no Minhocão, como a construção de uma esplanada para ligar viadutos.
Os vereadores contrários afirmaram durante a sessão que as propostas falham por não proteger áreas verdes e por não assegurar obras de moradia de interesse social. “Não precisamos de obras faraônicas. Precisamos de políticas públicas para que moradores e os comerciantes da região sejam valorizados”, afirmou Silvia Ferraro.
Parque do Bixiga
Outro tema de consenso na Câmara nesta terça-feira foi o projeto que autoriza a criação do Parque do Bixiga. Foram 53 votos favoráveis e nenhum contrário ao projeto de autoria do prefeito Ricardo Nunes (MDB). O terreno que dará lugar ao parque ficou conhecido por ser alvo de uma disputa que se arrastou por décadas entre o dramaturgo José Celso Martinez, fundador do Teatro Oficina, e do apresentador Silvio Santos. O mesmo projeto de lei também autoriza a criação do Parque do Banespa, na região de Santo Amaro.
O grupo, de mesmo nome do apresentador, planejava construir prédios no local, o que, segundo Zé Celso, ameaçaria o teatro, projetado pela arquiteta Lina Bo Bardi e tombado como patrimônio histórico. Em maio deste ano, a prefeitura concluiu as negociações com o grupo Silvio Santos, que aceitou vender para gestão municipal, por R$ 64,3 milhões, o terreno de 11 mil metros quadrados, no bairro Bela Vista, região central. Zé Celso morreu em 2023, antes da definição sobre o futuro do local.
O único ponto de divergência entre os vereadores de oposição a Nunes e da base aliada foi quanto ao nome do parque. Parte da base do prefeito queria batizar o local de “Parque Abravanel”, referência ao nome de batismo do apresentador. Para os contrários, a sugestão é ofensiva, já que o grupo defendia outra finalidade para o terreno e por anos travou a criação do parque. A oposição queria dar o nome de Zé Celso ao parque. O vereador Atílio Francisco (Republicanos) apresentou a sugestão de homenagear o compositor Adoniran Barbosa. Os vereadores concordaram em deixar para uma futura votação a definição do nome.
Fonte: Valor Econômico – Política, por Lilian Venturini e Lucas Ferraz, Valor – São Paulo, 02/07/2024