Incorporadores de São Paulo aguardam a publicação de um decreto pela prefeitura da cidade para que projetos que seguem as regras estabelecidas após a revisão do Plano Diretor e da Lei de Zoneamento, que foram atualizados em julho de 2023 e janeiro deste ano, possam chegar às ruas. O setor destaca que não estão sendo aprovados novos empreendimentos de médio e alto padrão na cidade desde meados do ano passado, o que pode atrasar o ciclo de lançamentos na capital.
O decreto trata dos valores cobrados pela outorga onerosa, taxa para se construir acima de um determinado limite em uma área. Com a revisão das leis, houve mudanças em como o cálculo deve ser feito e os técnicos da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) não podem emitir alvarás para novos projetos enquanto o entendimento não for pacificado. Um grupo de trabalho foi criado em março pela prefeitura para definir os critérios. O grupo tinha um prazo de 30 dias úteis para analisar o problema.
Perguntada no início de maio sobre o andamento do grupo de trabalho, a SMUL afirmou que essa etapa já havia sido concluída e que o decreto seria publicado nas próximas semanas. Na última quinta-feira (6), a secretaria afirmou que o documento ainda não foi publicado.
Ely Wertheim, presidente-executivo do Secovi-SP, entidade que reúne entes do mercado imobiliário paulista, afirma que uma certa demora já era esperada pelo setor, porque ela também ocorreu com os planos diretores passados.
No entanto, ele ressalta que pode haver um “gap contratado de falta de projetos” em algum momento de 2025, em decorrência da demora na aprovação de novos empreendimentos. Quanto mais o tempo passa, mais projetos entram na fila de aprovações.
No ano passado, 232 empreendimentos residenciais foram aprovados pela prefeitura em todos os segmentos, menos da metade das 501 liberações em 2022 – o auge de aprovações na última década foi em 2020, com 900 projetos.
A incorporadora Vitacon, que já lançou dois empreendimentos neste ano e quer terminar 2024 com dez, adiou por causa da paralisação das aprovações o lançamento do projeto que será “uma das joias” do seu ano, segundo o CEO Ariel Frankel, na Bela Vista. “Está travado, a prefeitura ‘puxou o freio de mão’”, diz. Agora, a previsão, é iniciar as vendas em agosto. A empresa tem ainda mais oito empreendimentos na fila. “Está todo mundo esperando que isso se resolva até a próxima semana, para as coisas começarem a andar”, afirma Frankel.
O diretor de uma gestora de recursos que investe em incorporações, que pediu para não ser nomeado, teme que haja um acúmulo de pedidos de aprovação, com a demora para o decreto sobre a outorga onerosa, que vai sobrecarregar a prefeitura. Ele cita a sazonalidade do segmento imobiliário como um agravante.
“Tem desaceleração natural no meio e no fim do ano, quando as pessoas estão de férias, então um atraso de um ou dois meses, na prática, significa transferir o lançamento deste ano para o próximo”, afirma.
O mesmo executivo, que tem dois projetos parados em fase de aprovação, reforça que não há “má vontade” na prefeitura, e que o tema é complexo. Para ele, o fato de a Lei de Zoneamento ter sofrido vetos do prefeito Ricardo Nunes, parte deles derrubados pela Câmara apenas em abril, contribuiu para esse atraso.
Está todo mundo esperando que isso se resolva, para as coisas começarem a andar”
— Ariel Frankel
Duas incorporadoras de capital aberto consultadas pelo Valor também citaram preocupação com atraso nos lançamentos.
Esse problema afeta exclusivamente empreendimentos de médio e alto padrão, porque os projetos populares, classificados como Habitação de Interesse Social (HIS) ou Habitação de Mercado Popular (HMP) são isentos do pagamento de outorga onerosa.
O diretor de uma incorporadora que atua nessa área afirma que os empreendimentos da empresa estão sendo aprovados “em um prazo razoável”. “Mas tenho ouvido reclamações do pessoal de média e alta renda”, afirma, citando que o vai e vem de aprovações “trouxe insegurança” sobre o que vale ou não no regramento urbanístico da cidade.
Ao Valor, a SMUL afirmou que segue analisando e emitindo alvarás para empreendimentos protocolados antes da revisão do PDE, mas que é necessária a regulamentação dos novos dispositivos de outorga onerosa para que possam ser analisados os processos autuados depois da revisão do plano.
É usual que as incorporadoras tentem protocolar empreendimentos na prefeitura antes de mudanças nas leis de urbanismo, para garantir que projetos já iniciados – com terrenos comprados, por exemplo – possam ser construídos como originalmente previstos. Essa antecedência permite que os lançamentos continuem ocorrendo por um tempo, mesmo com a paralisação de análise de novos projetos. Por isso, afirma Wertheim, é difícil precisar quando essa lacuna nos lançamentos deve ocorrer.
De janeiro a abril deste ano, foram lançadas na cidade 9,1 mil unidades de médio e alto padrão, crescimento de 5% sobre o mesmo período de 2023. Já as vendas avançaram 35%, para 14,8 mil unidades no mesmo intervalo, o que ocasionou uma redução do prazo de escoamento da oferta desse tipo de imóvel na cidade, de 12 meses ao fim de 2023 para 9 meses em março deste ano.
Fonte: ABECIP – Por Valor Econômico – São Paulo, 10/06/2024