A reforma tributária aprovada em dezembro do ano passado instituiu no Brasil o Imposto Seletivo (IS), um tributo existente em muitos países com o propósito de desestimular ou compensar os prejuízos provocados sobretudo à saúde e ao meio ambiente por determinados produtos. Cigarros e bebidas alcoólicas estão entre os itens mais taxados pelo tributo que também é chamado de Imposto do Pecado.
Mas o Brasil corre o risco de se tornar o único país do mundo a cobrar o IS do setor de mineração, uma medida que pode provocar diversos prejuízos à economia nacional, incluindo perda de competitividade às exportações e aumento de preços de eletrodomésticos, veículos, insumos da construção civil e itens essenciais à transição energética.
A previsão de cobrança do IS sobre a mineração foi incluída na reforma tributária, e sua aplicação será discutida no Congresso Nacional nas próximas semanas. O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) vem colaborando nesse debate com dados e argumentos que mostram os riscos que a cobrança acarretaria ao país.
“Caso o Imposto Seletivo seja aplicado também sobre as exportações dos minerais, o impacto será devastador para a competitividade internacional dos nossos produtos minerários”, afirma o diretor-presidente do Ibram, Raul Jungmann. “Um levantamento da consultoria EY mostra que o Brasil já possui a maior carga tributária sobre a produção de dez minerais entre os seis maiores produtores de commodities do mundo. A oneração do setor por mais um tributo deixaria o país ainda menos competitivo frente aos seus principais concorrentes.”
A mineração ocupa posição de destaque na economia brasileira, empregando quase 2,5 milhões de pessoas ao longo de sua cadeia produtiva e representando 4% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2023, o setor gerou R$ 248 bilhões em receitas e quase US$ 43 bilhões em exportações, proporcionando um saldo comercial positivo de US$ 31,95 bilhões ao setor. O valor representou 32% do saldo total da balança comercial brasileira.
No mesmo período, a indústria da mineração recolheu R$ 85,6 bilhões em tributos e encargos, incluindo R$ 6,9 bilhões de Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem). A cobrança de um novo tributo sobre a atividade compromete o futuro desses resultados.
ONERA EXPORTAÇÕES
O presidente do Ibram argumenta que o IS, um tributo projetado para reduzir ou desestimular o consumo de bens prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, é incompatível com a mineração, como atesta a experiência internacional. Segundo Jungmann, a imposição desse imposto às exportações, como vem sendo proposta, contraria os fundamentos da política de comércio internacional e os objetivos da própria reforma tributária, que buscou não onerar as exportações.
A cobrança, não sendo beneficiada por compensação tributária aos exportadores, reduziria a competitividade do Brasil no mercado internacional, impactando negativamente a economia, a geração e manutenção de empregos e a entrada de divisas no país. Um estudo da LCA Consultores mostrou que a aplicação do IS provocaria uma perda aproximada de R$ 736 milhões nas exportações brasileiras de minério de ferro.
A oneração também causaria aumento de custos para um amplo grupo de indústrias que utilizam o minério como insumo, de setores como construção civil, produção de veículos, utilidades domésticas, alimentos enlatados e embalagens, gerando aumento de preços no mercado interno e redução da competitividade internacional desses segmentos.
Outro ponto de conflito, aponta o presidente do Ibram, diz respeito à natureza do imposto, originalmente destinado a produtos finais, como bebidas alcoólicas e cigarros. No caso do minério de ferro, ele incidiria sobre um insumo primordial nas cadeias produtivas, sem substitutos viáveis, gerando um efeito de cumulatividade tributária contrário aos objetivos da reforma tributária.
A aplicação do Imposto Seletivo sobre a mineração, pontua Jungmann, também afetaria a transição energética. “A mineração é a indústria das indústrias, insumo para tudo”, ressalta ele.
“Sem o aço, que é feito do minério de ferro, não temos carro elétrico, aerogeradores ou placas solares. Por sua vez, todos esses equipamentos importantes para a transição energética demandam os chamados minerais críticos e estratégicos, como lítio, nióbio, terras-raras e cobre. Ou seja, a mineração brasileira tem um papel estratégico para tornar o Brasil o principal protagonista para a transformação energética pela qual o mundo precisa passar”, diz Jungmann
De acordo com a Agência Internacional de Energia, os investimentos voltados à transição energética devem somar U$S 1,2 trilhão no mundo até 2030. O encarecimento das cadeias produtivas brasileiras pela inclusão do IS na mineração pode reduzir a atração de parte desses recursos ao país.
“O Brasil tem elevada vocação mineral, com províncias minerais espalhadas por todo o território, mas é preciso dar condições para que esse mercado se desenvolva com segurança jurídica e fiscal”, alerta Jungmann. “Criar esse ambiente tributário só irá afastar novos investimentos, levando o país a perder a oportunidade de liderar a transição energética no mundo.”
Fonte: Valor Econômico – Ibram – 10/07/2024